A maioria dos turistas que visitaram o Rio Grande do Norte em julho deste ano optou por se hospedar em hotéis, segundo dados do relatório do Sistema de Inteligência Turística do RN (Sirio), elaborado pela Fecomércio-RN. Os números indicam crescimento em relação a janeiro de 2021, quando 25,7% dos visitantes preferiam ficar em hotéis. Em julho, o índice subiu para 40%. Empresários do setor avaliam que o crescimento deve se manter, mas ainda é preciso cautela.
“A expectativa é positiva, principalmente para o verão. Nós esperamos conseguir, ao menos, amenizar o prejuízo que tivemos ao longo desse um ano e meio, período em que houve o agravamento da pandemia”, prevê o proprietário do Pipa Lagoa Hotel, José Odécio.
O empreendimento, localizado no distrito de Pipa, em Tibau do Sul, passou por um período de portas fechadas – entre março e agosto do ano passado. As dificuldades, que começaram com a suspensão das atividades, permaneceram com a reabertura, decorrentes da ausência de turistas.
“Na alta estação, tivemos uma queda de ocupação e faturamento de mais de 30%. Nós esperávamos que fosse melhor. Hoje, estamos trabalhando com o turismo ainda eminentemente regional, que só garante ocupação aos finais de semana”, relata José Odécio.
Para o feriado de 7 de Setembro, a ocupação no Pipa Lagoa Hotel girou em torno dos 70%, abaixo dos cerca de 90% costumeiramente registrados nos anos anteriores, de acordo com informações do empresário.
José Odécio afirma que chegou a demitir funcionários no ano passado, mas alguns programas do Governo Federal, que permitiram a redução de jornada e a suspensão de contratos de trabalho, ajudaram a garantir a recontratação de trabalhadores que haviam sido dispensados. “Nos últimos quatro meses não tivemos demissão. Esperamos que não haja nenhum tipo de retrocesso daqui em diante para, assim, conseguirmos atingir um equilíbrio”, pontua.
Se a crise trouxe inúmeros desafios para os grandes empreendimentos do setor hoteleiro, para os pequenos negócios essas dificuldades se mostraram monumentais, às vezes, até incontornáveis. “Dezenas de pequenos hotéis e pousadas fecharam as portas e é pouco provável que consigam reabrir”, afirma o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH-RN), Abdon Gosson.
No caso de pousadas, a recuperação parece ainda enfrentar alguma instabilidade. De acordo com a pesquisa do Sirio RN, o número de pessoas que utilizaram esse tipo de hospedagem era de 27,7% em janeiro deste ano. Três meses depois, em abril, o índice caiu para 21,7%, mas houve uma leve reação em julho, com registros de 23,8%.
Priscila Müller, gerente de marketing, relacionamento e inovação do grupo Águia, que administra a pousada Águia Flats, em Ponta Negra, conta que o empreendimento passou por momentos difíceis, com quedas expressivas no número de hóspedes.
“Não fechamos em nenhum momento, mas tivemos uma redução de 40% no número de hospedagens durante a semana e de 80% durante o final de semana. Nossa preocupação era manter os colaboradores, o que foi possível com a suspensão de metade dos contratos de trabalho”, relata.
Os empresários Mara Ventura e Rafael Ventura foram audaciosos e decidiram instalar a pousada Flor D’Açucena, em Ponta Negra, em pleno recrudescimento da pandemia, no último mês de abril.
Depois de um início de baixa procura, os dois estão otimistas em relação à ocupação nos próximos meses. Rafael e Mara atribuem as boas perspectivas ao avanço da vacinação. “Já estamos com o Réveillon fechado e com muita procura para janeiro. A gente observa uma crescente no número de reservas”, conta Mara Ventura.
Custos altos
Entretanto, apesar da boa expectativa, os constantes aumentos dos preços de produtos alimentícios, energia elétrica e combustíveis preocupam os empresários ouvidos pela TRIBUNA DO NORTE, que têm atuado de forma cautelosa em relação às ações para os próximos meses.
“Temos uma preocupação com o mês de janeiro de 2022, porque não sabemos como estarão os preços dos insumos e produtos. Só a energia elétrica já aumentou diversas vezes este ano. O preço do pão muda toda hora. Nosso receio é fechar reservas para janeiro, porque a gente não sabe se os valores cobrados agora vão conseguir cobrir os gastos lá na frente”, descreve Raphael Ventura.
José Odécio, do Pipa Lagoa Hotel, também destaca os altos preços decorrentes da inflação, como um desafio para a retomada do setor. “Esse retorno está vindo com um aumento muito grande de todos os custos. Só a energia subiu mais de 60%. Isso pesa muito e nem sempre dá para transferi-los para a tarifa”, conta.
José Odécio disse que, por causa das dificuldades, não planeja ampliar a estrutura do hotel, mesmo com a perspectiva de crescimento daqui para frente. “Estamos fazendo somente os serviços de manutenção necessária”, aponta.
No caso da pousada Águia Flats, a preocupação com os números da inflação é grande. Nem a melhora no número de reservas tem animado o grupo que administra a pousada.
“Para o final do ano, nossa ocupação já está em 100%, mas isso não vai recuperar os meses que passamos só com os custos. Minha preocupação agora é com a economia como um todo. Com os constantes aumentos, o custo de vida das pessoas é elevado e o dinheiro para viajar acaba sendo direcionado para esse custo de vida. No final das contas, não vejo esse cenário de forma tão otimista”, descreve Priscila Müller, gerente de marketing, do grupo Águia.
Atual momento é de recuperação, diz ABIH
O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH-RN), Abdon Gosson, avalia que o processo de retomada das atividades para o setor de hotelaria no Rio Grande do Norte acontece por etapas. Segundo ele, o momento é de recuperação, mas ainda sem grandes razões para comemoração.
Gosson, que também é proprietário do hotel Best Western Premier Majestic, em Ponta Negra, afirma que as dificuldades enfrentadas pelos grandes empreendimentos são semelhantes.
“Reconheço que o momento atual é de recuperação. Retornamos com o turismo regional – aquele que o turista vem de estados vizinhos. Nesse caso, os hotéis ficam ocupados apenas no final de semana. E isso é muito ruim. O ideal é o turismo nacional, ou seja, as pessoas vêm para cá e passam a semana inteira nos hotéis. A retomada desse nicho acontece agora”, descreve Gosson.
“São turistas de Porto Alegre, Belo Horizonte, Brasília e São Paulo, que chegam ao RN de avião, ao contrário do visitante regional, que viaja quilômetros de carro para chegar ao Estado. E a gente espera, daqui em diante, a chegada do turista internacional, que passa mais tempo do que o turista nacional e chega com mais dinheiro”, detalha Abdon Gosson.
De qualquer modo, o empresário e presidente da ABIH, analisa que o cenário atual é de otimismo, haja vista as dificuldades enfrentadas até então. Segundo Abdon Gosson, 95% dos hotéis do Estado permaneceram fechados integralmente por cerca de sete meses. Entre março e julho de 2020, afirma ele, a ocupação dos empreendimentos que se mantiveram em operação não superou os 20% e o número de demissões em um ano e meio atingiu cerca de 70%. “Muitos donos de hotéis e pousadas contraíram dívidas e talvez nem consigam quitá-las. Nós estávamos operando no vermelho e só agora podemos dizer que iremos operar no verde”. A vacinação é a aposta para que as atividades ganhem fôlego. “Com o processo de imunização, estamos com uma retomada gradual e consistente, que vem crescendo mês a mês”, acrescentou o presidente da ABIH-RN.
Mara Ventura, da pousada Flor D’Açucena, acrescenta outro fator à vacinação para que outros fatores. “Muitas pessoas estão há muito tempo sem sair de casa, aguardando o momento de poder viajar. Mas é importante que elas ganhem poder de compra. Ainda assim, nossa expectativa é boa”, sublinha a empresária.
Federação vê alta temporada bastante positiva
A Federação do Comércio, de Bens, Serviços e Turismo do RN (Fecomércio-RN) afirmou que os números apresentados pela Sistema de Inteligência Turística do RN (Sirio) apontam para uma alta temporada “extremamente positiva”, especialmente a partir de novembro. A Federação também atribui as boas perspectivas ao avanço da vacinação no Rio Grande do Norte.
“Estamos otimistas, embora saibamos que, recuperar todas as perdas do setor demandará, pelo menos, mais duas altas estações fortemente aquecidas”, afirmou o presidente da Fecomércio, Marcelo Queiroz. O presidente da ABIH-RN e proprietário do hotel Majestic, de Ponta Negra, concorda: “Não se tira um prejuízo de mais de um ano em dois meses. O setor como um todo só vai voltar aos padrões de 2019 a partir do final de 2022”.
A próxima grande temporada, no entanto, será o termômetro para uma avaliação mais fiel do que virá a seguir, na opinião de Marcelo Queiroz, da Fecomércio. “Será um divisor de águas. Natal figurou entre os destinos mais procurados pelos viajantes no último mês de julho e tem sido destaque nos principais sites de busca especializada para o período de novembro a janeiro próximo”.
Queiroz destaca que já existem divulgações de eventos para o Réveillon em Pipa, São Miguel do Gostoso e ressalta as perspectivas de retomada do turismo de negócios. “Há um cenário firme para esse segmento, com a realização de congressos, seminários e eventos técnicos. A Fecomércio liderou a construção do Plano de Retomada dos Eventos, chancelado pelo Governo do Estado, que elaborou um calendário de flexibilização. Os eventos técnicos já foram liberados integralmente”, afirma o presidente da Fecomércio.
Fonte: Tribuna do Norte/Foto: Magnus Nascimento